sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Sobre o abandono

Normalmente meu dia é: casa-facul-trabalho. Mas algumas raras vezes consigo dar um pulinho em casa na hora do almoço pra descansar um pouco ou tomar banho. Para que eu alcance essa façanha os ônibus têm que passar no ponto no exato momento que eu chego nele. Considero que os dias que eu consigo fazer isso são realmente de sorte!


Aconteceu essa semana que um professor meu bateu o carro, coitado, aí não tivemos aula dele e eu voltei cedinho pra casa, não devia ser nem 10h da manhã.


Descendo o meu morro, como de costume, eu notei uma pequena movimentação na porta do prédio vizinho. Quando me aproximei vi duas crianças em torno de uma caixa de papelão que um dia havia embalado uma TV de LCD. Dentro da caixa estavam cinco cachorrinhos filhotes.


As crianças viraram a caixa para que os bichinhos pudessem sair. Um dos cães, que aparentava ser o mais novo de todos, escapuliu sem ninguém perceber e quando vi já estava no meio da rua. Eu moro numa pirambeira danada, carro desce aquilo ali descontrolado, sem nem pensar fui buscar o pequenino.


Sou fã de cachorro. Adoro! Não tenho um porque, no fundo, acho uma tremenda crueldade prendê-lo num apartamento - e a senhora minha mãe não é lá muito fã da bagunça que fazem. Quando peguei aquela bolinha de pêlos (fedida e suja) no colo quase morri de amor. Coloquei-o de volta perto dos irmãos, mas ele veio na minha direção e ficou entre meus pés.


Eu precisava ir pra casa. Tinha pouquíssimo tempo para tomar banho, almoçar e dormir 5 minutinhos. Mas a questão era que eu simplesmente não conseguia abandonar a criaturinha.


Os moradores do prédio, aos poucos, foram aparecendo na janela. A decisão foi de levar todos para dentro da garagem, alimentar e depois chamar uma dessas instituições que recolhem animais abandonados. Só que eu não conseguia deixar aquele cachorrinho magrinho que brincava com meu pé. Numa subita decisão, peguei-o no colo e levei pra casa.


Sabia que não podia ficar com ele, mas tinha a esperança de conseguir um bom lar pro coitadinho. Ele era tão magrelo! E na barriga, só tinha verme. Dei comida, lavei, sequei, cuidei – e claro, me atrasei.


A questão é que eu seria completamente incapaz de abandoná-lo mesmo com apenas dois minutos de convivência. Me pergunto como alguém pode ter sido tão cruel e covarde a ponto de fazer isso. Aí me deparo com a triste realidade de que se existe gente suficiente fria para abandonar um filho, claro que existiriam aqueles dispostos a fazer o mesmo com cachorros.


Há mais ou menos dois meses me choquei com a notícia de mais um caso de abandono de recém-nascido. Aconteceu em Belo Horizonte mesmo. A mulher entrou no banheiro de uma oficina, pariu e colocou o menino em uma sacola plástica. Simples assim, como se tivesse tirando dela um absorvente usado. Ela foi embora e logo depois – Graças a Deus – duas pessoas encontraram a criança, que sobreviveu.


Quem se lembra do caso da menina jogada na Lagoa da Pampulha? Ela também sobreviveu, mas a mãe, que foi presa, agora tenta reaver a guarda dela. Absurdos existem, milagres também...


Acredito que essas mães – assim como o dono dos cachorros abandonados, se me permitem o paralelo – tinham todo direito de, por alguma razão, não ficarem com os bebês. Mas elas podiam ter escolhido outra opção, que não o abandono. O abandono de incapaz, pra mim, é uma tentativa de assassinato, um homicídio doloso. E o cúmplice é quem se cala diante daquilo que pode, tão nitidamente, ver.

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