quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Algumas coisas que não devemos ouvir

Quando comecei o blog contei sobre o que me incentivava a escrever sobre conversas no ônibus. Ouve-se muita coisa inusitada, sem pé nem cabeça. Muitas vezes literalmente pegamos o bonde andando e não dá para acompanhar a conversa inteira. É preciso muita habilidade. Esses dias para trás aconteceu uma coisa que eu adoro. Embarquei junto com uma outra senhora, sentei no banquinho mais alto (síndrome de baixinha) e ela se assentou ao meu lado. Quando o ônibus arrancou eu ouvi:

- Psiuu. Raquel!

Era a senhora que se assentava na janela do outro lado do corredor. Nesse momento eu soube que conseguiria ouvir uma boa história de comadres.

- Márcia! – Respondeu Raquel.
- Quanto tempo, como está?
- Bem e você? Continua morando por aqui?
- Continuo sim, você também né? Como vai a família? E os meninos? Você tem dois não é?
- Tudo ótimo Márcia. Continuo casada, a Júlia está terminando o terceiro ano e o Pedro forma em designer essa sexta.
- Sério, menina?! Que maravilha hein. Vai ter festa?
- Vai sim. Acho que será no Jardim Canadá.
- Ah, quando minha filha formou a festa foi em um lugar lá também. Achei muito perigoso de ir e voltar tarde.
- Mas eu estou acostumada. Estou largando aos poucos essa vida urbana. Estava há dois meses no sítio, voltei ontem.
- Mas é aqui perto?
- Pertinho, em meia hora chego ao trabalho, mais rápido do que morando aqui.

Breve silêncio enquanto as pessoas passam entre elas.

- Raquel, você tem notícias da Meire?
- Tenho sim. Última vez que a vi estava um caco. Separada do marido, duas filhas adolescentes e uma grávida, terrível. – Pausa, olha para um lado e para o outro e continua: Não conta jamais que eu te contei, mas dizem que ela levava umas surras do marido.
- Não me diga! Coitada! Era Francisco o nome dele não é mesmo?
- Não. Francisco é o nome do marido da irmã dela, a Mércia. Essa ainda está casada, vida boa, morando no Belveder agora.
- Engraçado né? Como o destino de duas pessoas geradas na mesma barriga ao mesmo tempo pode ser tão diferente.
- Diz que é carma. Tem gente que tem isso.

Outra breve pausa, Raquel se muda para o banco ao lado de Márcia, o que dificulta ouvir a conversa.

- E sua filha Márcia? Continua bonita como sempre?
- Nada. Eu acho que agora é que ela está bonitona. Antes ela era feinha. Mas hoje em dia a medicina faz milagre, até o cabelo melhorou.
- Que isso, sempre achei ela linda com aqueles olhos azuis.
- Olhos? Com os óculos que ela usava quando você a conheceu nem dava pra ver!

Silêncio.

- É Bruna o nome dela, não é Márcia? Como ela está?
- É. Ela ta morando na Inglaterra agora. Foi lá fazer um mestrado em química
- Que sucesso! Deixou a mãe super orgulhosa!
- Bom, na verdade estou me dedicando à Luiza agora, minha caçula.
- Luiza? Você teve outra filha?
- Tive, com o Oswaldo. Já tem 7 anos.
- Nossa, é mesmo, você se casou de novo. Já estão há quanto tempo juntos?
- No total 17 anos. O ruim é que até hoje não moramos juntos.
- É? Decidiram ser um casal moderno morar em casas diferentes?
- Não, ele ainda não contou para esposa.

Chega o ponto final do ônibus e nós três descemos. Mudas.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Climatologia

Só quem fica o dia inteiro fora de casa consegue entender o quanto é ruim quando o clima está instável. Não tem jeito, ou você sente frio ou calor demais. Ou você sai de casa com três blusas, ou escolhe um vestido. Se você depende de ônibus o caso piora. Quando se está de carro você pelo menos pode deixar uma muda de roupa lá no porta-malas, para qualquer eventualidade. Esses dias de agosto estão assim. Uma hora tremo e dez minutos depois estou derretendo. Achei que essa era só mais uma das minhas implicâncias de filha-única-criada-por-vó-em-apartamento, mas hoje descobri que não.

No ponto, esperando o segundo ônibus para casa, chega uma Dona que olha pra mim e começa:

- O dia hoje não decide se está frio ou calor, não é? Odeio tempo assim. Eu sai de casa cedo sem o suéter, cheguei no trabalho e coloquei a blusa embaixo do colete. Agora estou aqui no ponto morrendo de frio, sendo que há dois minutos eu atravessava a praça derretendo de calor.
- É verdade. E ainda tem gente por aí que anda de regata.
- Não entendo como essas pessoas conseguem andar assim, se ainda levassem um casaco... Mas eu acho que carregar a blusa de frio às vezes é pior. Ou colocamos dentro da bolsa e ela fica estourando ou vamos carregando e aí quando entramos no ônibus a blusa cai, colocamos no colo, alguém esbarra e derruba de novo, no fim do dia o agasalho está todo pisado e sujo.
- Pois é, eu também sou desajeitada para carregar coisas e quando uso uma bolsa grande tenho que ficar me contorcendo para não esbarrar em todo mundo...

Levantei para dar sinal pro 9103 que se aproximava. A Dona também se levantou.

- Engraçado né. Comecei a conversar com você e nem sei seu nome, eu tenho essa mania. Adoro conversar no ônibus, vou tagarelando o trajeto inteiro. É bom porque no ônibus ninguém presta muita atenção no que a gente fala, né?!
- É mesmo...

Se é.

Socialização

Era dezembro de 2008. 5102 vazio ali no primeiro ponto da Catalão depois do Cemitério da Paz, um verdadeiro milagre. Tenho síndrome de baixinha, adoro os bancos mais altos do ônibus, sempre que entro e estão vazios sento-me neles. Nesse dia não foi diferente.

Gebrim trabalhava comigo na época e também é meu vizinho, ou seja, companhia de viagem. Estávamos num papo animado, falando desde cenouras até música clássica, e foi enquanto falávamos sobre música e trocávamos fones de ouvido que o rapazinho do banco ao nosso lado começou:

- Rapazinho: Pô cara, olha meu celular. É igual o seu né?
- Gebrim: Oh amigo, não é não, o seu é um modelo à frente.
- Rapazinho: O meu tem GPS, acesso a internet...
- Gebrim: O meu é mais simples.

Continuamos a conversar, Gebrim e eu, quando novamente:

- Rapazinho: Estão voltando de onde?
- Gebrim e eu: Do trabalho.
- Rapazinho: Eu tava na federal, estudo lá – disse isso tirando a carteirinha e apontando em nossa direção
- Gebrim e eu: Ah...
- Eu: Ele também – apontando pro Gebrim
- Rapazinho: Que curso?
- Gebrim: Engenharia – diz isso me lançando um olhar de “pára de render assunto”
- Rapazinho: Eu faço ciências da computação.

Nesse momento eu e Gebrim nos olhamos e dissemos mentalmente: “ta explicado!”. Voltamos ao nosso papo super interessante sobre música quando, de repente, ouvimos:

- Rapazinho: Ouve essa música aqui, muito boa!

Nessa hora eu já tentava, inutilmente, me concentrar na janela, na rua, no passeio, em qualquer coisa, pra não rir. A questão é: eu não sei rir baixo, se começasse seria um escândalo, uma vergonha pros três. O Gebrim é muito sociável, trata todo mundo bem, eu teria ignorado as mãos estendidas, mas ele jamais o faria. Pegou os fones, pôs no ouvido, esperou um minuto e devolveu, acenando com a cabeça:

- Gebrim: É, realmente boa!

Sabe aquela história de “o problema em ser sarcástico é que quando não entendem o idiota é você?”, então. Acontece que eu entendi e fui a idiota da história. Soltei a gargalhada engasgada, aquelas bem altas, de quem tava se segurando há muito tempo. Comecei a escorregar do banco de tanto rir, o Gebrim, coitado, me cutucava e falava “Teani, pelo amor de Deus, pára!”. Não adiantava. As pessoas me olhovam assustadas e eu já via a hora do Gebrim se levantar e fingir que não me conhecia. Fui assim desde o ponto do Minascentro até o último da Augusto de Lima. Eu nem acho que aquele era o lugar que o rapazinho deveria descer, mas foi um constrangimento tão grande que ele saltou sem ao menos se despedir.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Fundamentos de Economia

4106 no fim da manhã. Estava voltando da minha aula de economia e o papo da professora sobre dar valor às nossas moedinhas e que as de dez centavos são umas das mais caras do mundo, ainda estava fresco na minha cabeça.

Adoro quando aquele banco individual do ônibus está vazio. Meu senso coletivo é bem atrofiado pela manhã, como eu já disse. Sentei-me nele. Batia um sol leve e gostoso pra esquentar o ar gelado que entrava. Encostei na janela, coloquei meus fones, fechei os olhos e já estava quase cochilando quando ouço:

- Oi, você me deu o troco errado.
- Como assim, meu caro? Está certo.
- Não rapaz, eu te dei R$10,30, ou seja, você tem que me voltar 8.
- Sim. Mas eu não queria os seus trinta centavos. Por isso te devolvi 7,70 e aqui estão seus trintas centavos.
- Eu fiz isso pra facilitar o troco, porque eu odeio moedas.
- Eu também odeio moedas, fique com essas e mais as suas.
- Cara, mas você é trocador!
- E só por isso eu tenho que gostar de moedas?

Sempre comento algo do tipo “assaltei o trocador” quando estou com os bolsos lotados de moedas. Na minha cabeça eles gostavam delas, mas não! Isso me lembra uma vez que sentei naquele banco que fica de frente para o trocador e estava atenda à conversa dele com a moça ao meu lado. Ele dizia:

- Olha, tem gente que entra aqui e nem cumprimenta. Giram essa catraca como se não estivéssemos aqui e só nos dirigem o olhar quando tentam passar o cartão 5 vezes seguidas e ele não funciona. Me olham como se tivesse culpa dos créditos terem acabado. È muita falta de educação. Agora o pior mesmo é quando aqueles folgados entregam pra gente uma nota toda amassada e com dez moedas dentro. Aí dá vontade de xingar. Não sei por que pensam que trocador gosta de dinheiro todo amassado, e quanto mais moedinha melhor. Confundem a gente com dono de padaria!

Desse dia em diante eu nunca mais fiquei brincando de enrolar as notas ou catando as menores moedinhas até inteirar 1 real. Entrego o dinheiro bem esticado e, quando possível, entrego uma moeda de 0,25 e a outra de 0,05. Aprendi que dinheiro amassado e moedinhas de cinco centavos só vão pra padaria e ponto.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Leitura em Dupla

Eu não funciono muito bem até as 9h30 da manhã. Na minha opinião, a vida deveria começar depois dessa hora. Como voltei a estudar de manhã isso é um pouco impossível, por isso uso todo tempo que tenho antes de chegar à faculdade para cochilar. Procuro sentar sempre no banco da janela do ônibus, pra encostar e dar aquela dormidinha básica, afinal de contas, de manhã as pessoas são menos sociáveis e não tenho tantos assuntos para observar em meu trajeto.

Hoje o 8101 estava um pouco cheio. Na saída da Prudente de Moraes, só tinha sobrado um lugar vago e era bem ao meu lado. Entrou um homem, na casa dos 35 anos, imagino. Ele estava com jornais embaixo do braço e logo que se sentou foi abrindo:
Jornal Aqui e Super Notícias.

Como estudante de jornalismo, me interesso muito pelo jeito como as pessoas costumam ler as notícias. O homem pegou as duas capas, cada uma em uma mão, e começou a compará-las, como quem diz “qual eu leio primeiro?”. O
Super trazia as manchetes: “BH tem um carro roubado a cada 1,5 hora” e “Confirmadas 3 mortes por Gripe Suína em MG”. Já o Aqui destacava: “Gripe mata em Minas”. No primeiro estava a Tânia Khalill de biquíni, no outro a Paola Oliveira, vestida, com cara de “tô querosa”. Sem deixar de lado minha opinião editorial sobre ambos os jornais, fiquei curiosa para saber qual seria mais atrativa. Não a moça da capa, mas a manchete, claro.

O homem abriu primeiro o
Super. Sequer leu a página dois (que fica atrás da capa), e já foi dobrando na 3. Os títulos das editorias já me pareceram bem sugestivos: Assédio Sexual, Apreensão, Drogas. Tinha uma notícia em destaque falando sobre a mulher que foi ao ginecologista e o médico fez comentários que estavam fora da conduta ética, outra sobre a maconha que foi encontrada no interior e uma última falava da prisão de um foragido. Nas páginas seguintes notícias sobre morte, violência, roubos e esportes.

Quem sou eu para criticar, tem gente que gosta de sangue assim, no café da manhã. Eu já penso que ele me desce melhor com a janta, aí o dia já esta no fim e o pensamento de “o mundo não tem mais jeito”, dura só até a hora de dormir, quando assuntos mais banais, que correspondem ao meu próprio umbigo, começam a rondar minha cabeça. Não sei se o homem percebeu minha cara de aterrorizada, ou meu olho
bicando a leitura dele incomodou, mas assim que alguém saiu ele pulou pro banco da frente e acabou-se minha distração.

domingo, 9 de agosto de 2009

Paqueras

Não sei se só eu penso assim, mas existem lugares e lugares para paquerar. Quero dizer, quando você está num barzinho, balada, night e derivados, tudo bem. Mas não consigo entender como existem pessoas capazes de fazer tal coisa em um shopping, supermercado, ou o pior, no ônibus.


5102 vazio, um milagre concedido pelas férias. Na altura da Rua da Bahia com Fernandes Tourinho entra a menina. Uniforme de vôlei, cabelo preso, mochila nas costas. Dirige o olhar para o rapaz sentado:


- Oi, José, tudo bom?

- E aí joia?


Tudo bem, a menina educada conhecia o rapaz e o cumprimentou normalmente. Sentou-se no banco à frente dele e já preparava para colocar os fones.


- Virou loira agora? – Disse ele uma vez. – Hein? – Continuou.

- Oi? – ela vira fazendo cara de “é comigo?”

- Está loira agora?

- Não. Na verdade é ruivo e já faz tempo que tá assim.

- Ah...


Ela virou novamente para frente e ajeitava os fones quando o tal José recomeçou:


- Mudou para esses lados agora?

- Já tem uns 10 anos que moro aqui. – respondeu, sem se virar.


Devemos compreender que realmente existe gente que não se toca:


- Trabalhando?

- Treinando.

- Minas?

- Uhum. – Vamos lembrar que ela trajava o uniforme do clube.

- E faculdade?

- Ed. Física.

- UFMG?

- Não. UNI-BH.

- To fazendo direito.... Na FUMEC... Tava numa entrevista de estágio agora

- Ah.. – ela vira e olha pra ele de cima a baixo, analisando a roupa – Conseguiu?

- Não. Recusei... sou difícil.


Ela se virou de frente e eu não pude ver a cara que fez. Deixo aqui espaço pra imaginação.


- Moro aqui. Ali onde aquelas tem aquelas luzes acesas.

- Hum. Moro mais pra frente.

- Bom te ver! Não some não! Vamos encontrar mais!

- É... tchau.


A menina da um sorriso amarelo, permanece sentada, acena um tchauzinho com a mão e espera o rapaz descer. Coloca enfim os fones soltando um suspiro que, penso, dizia: “é tenso aguentar isso no fim do dia”.


Como eu disse, existem lugares e lugares.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

She had a bad day

Desde que os Ipods, MP3, 4, 5 e derivados se disseminaram, minha distração nos ônibus diminuiu bastante. É um individualismo que impressiona. Moro no ponto final de dois ônibus, por isso costumo embarcar neles vazios. Um dia desses estava reparando nas pessoas que entravam (só pra variar) e notei que dos quinze passageiros, contando comigo, quatorze estavam com fones de ouvido, a exceção era uma senhora, com mais de 65, na parte da frente. O trocador também portava seu radinho.

Por um tempo não tive conversas ou comportamentos para observar nos meus trajetos. Foi então que em uma dessas “viagens” entrei no 8101, ali na São Paulo com Álvares Cabral, mais ou menos. Eis que minutos depois entra mais uma pessoa: uma jovem com 3 cadernos nas mãos, uma mochila gigante à tira colo e, é claro, os famosos fones de ouvido. Ela se sentou naqueles bancos laterais que ficam no espaço para cadeirantes e ficou bem na minha frente.

Sou muito
reparadeira das coisas, mas raramente presto atenção em um rosto. Notei o dela. Seu olho estava borrado de lápis e rímel, aparência de quem chorou por horas. Tinha um olhar vago. De repente ela começou a chorar de novo. Primeiro umas, duas lágrimas secas, depois um rio. Aí vieram os soluços e mais pessoas no ônibus começaram a reparar. Daí os comentários: - “Ih, Brigou com o namorado”; “Alguém da família morreu”; “Deve ter ido mal na prova”... Cochichos e mais cochichos.

Dessa vez eu mudei de foco. Não me interessava o motivo do choro, como provavelmente não iria descobrir, ficaria frustrada. Comecei a observar o
Ipod. O que importava agora era a trilha que embalava o chororó. Quase me debruçava na tentativa de ler a telinha do aparelho, fazia isso à toa já que estava apagada. Comecei a fazer barulho, na minha cabeça se ela tivesse que aumentar o volume eu conseguiria ouvir, então peguei o celular e falava aos berros com a suposta pessoa do outro lado. Não adiantou. O ônibus freou e esbarrei nela pra ver se fazia algum movimento. Não adiantou. Tentei fazer o máximo de silêncio e chegar o ouvido o mais perto possível do fone dela, mas o volume estava bem baixo. Não adiantou. Foram várias manobras na tentativa de acender a tela, mas nenhuma funcionava...

O meu ponto já estava chegando. O ônibus tinha saído da Curitiba e entrado no Viaduto da Lagoinha. Não sei se vocês são assim, mas minha curiosidade é tanta que quando não consigo descobrir algo que quero, tenho insônia, perco a fome, fico de mau humor... Já estava quase cutucando a
fulana e perguntando o nome da música. Não precisou. Ela ia descer no mesmo ponto que eu e apertou o stop, a telinha acendeu. Eu, fazendo contorcionismo e apertando bem os olhos, consegui enfim ler: Bad Day - Daniel Powter. Sugestivo, não?

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Nascendo

Ouvir conversas alheias no ônibus é uma arte. Comecei a praticar essa atividade há cerca de cinco anos. Como sempre estudei de manhã e trabalhei durante a tarde, a hora do rush no transito é minha especialidade. Já tentei de tudo para passar as longas horas dentro do transporte público. Ler, ouvir música, pensar na vida, nos problemas, nas contas pra pagar... Tudo isso não era satisfatório. Ler em movimento me dá enjôo e eu igualmente enjôo das músicas que coloco no MP4 (ou antigo diskman). Pensar em problemas, nem se fala, haja dor de cabeça.

Quando comecei a prestar atenção nas pessoas que andavam nos ônibus tive muita dificuldade, afinal, você não pode deixar que o outro perceba e tem que se acostumar a não ouvir o fim das histórias. Odeio quando a pessoa desce no meio daquele babado forte, ou chega o meu ponto e eu tenho que saltar. Uma vez duas amigas conversavam sobre o caso amoroso da vizinha de uma delas e a história era tão interessante que eu continuei no ônibus, desci no mesmo ponto que elas e só parei de segui-las quando entraram em um prédio. Foi uma grande frustração, nunca saberei se o homem era ou não pai do filho da tal mulher.

Depois de anos de prática eu arranjei um truque: coloco fones no ouvido, como se estivesse ouvindo música. É difícil, já que algumas pessoas falam realmente baixo e eu tenho que fazer praticamente uma leitura labial. Outras são muito lentas e nem sempre a distância abrange o tamanho do caso. O bom é quando acompanhamos uma pessoa sempre. Aquela que, como você,
sempre pega a lotação no mesmo horário, desce no mesmo lugar... Aí sim!

Agora resolvi que está na hora de registrar as peripécias que ouço. Assim surge o: “essa eu ouvi no ônibus”, meu primeiro (espero que único) blog.